COM MAIS DE 60 ANOS, ELES DESCOBREM NO TEATRO UMA FORMA DE REJUVENESCERAula de teatro para a terceira idade na Estação Ciênciapalco para maiores por Rafael Balsemão / foto Beatriz Toledo
Aos 63 anos, Carlos Alberto Rodrigues brinca com a idéia de desbancar o galã Brad Pitt, 45, dois anos depois de passar a ter aulas de teatro. "Tô querendo encarnar o Benjamin", diverte-se ele, se referindo ao personagem do ator no filme "O Curioso Caso de Benjamin Button", sobre um homem que nasce com mais de 80 anos e começa a rejuvenescer. "De uma certa forma, é o que está acontecendo comigo. Remocei, revivi", diz ele, que, no palco, deu adeus à depressão.
O rejuvenescimento começou com o papel do personagem Guarda, em uma encenação de "O Pagador de Promessas", de Dias Gomes, no ano passado. O figurino foi ele mesmo quem montou, com direito a farda, botina e cacetete, comprados por R$ 50 em uma loja de artigos para policiais.
A apresentação única marcou uma nova fase na vida do aposentado, depois de 31 anos como técnico em telecomunicações na antiga Telesp. "Foi espetacular. Estou me descobrindo", afirma ele, um dos 30 alunos de um curso de teatro para a terceira idade realizado na Estação Ciência, da USP, na Lapa. Assim como ele, a maioria dos colegas passou dos 60.
As aulas, gratuitas, acontecem nas tardes de quarta-feira, durante três horas. O grupo é coordenado por Cauê Mattos, 46. É a primeira vez que o ator e diretor assume o papel de professor. De cara, encontrou uma galera cheia de especificidades. "O corpo não responde na mesma velocidade", explica Cauê. "Temos que respeitar." Na fila de espera para participar do grupo, 80 pessoas.
Alguns alunos têm tratamento especial, como Vielda Brognera, 88, que, no passado, chegou a fazer um vestido para a atriz Cacilda Becker, mito dos palcos nacionais. Com dificuldade para andar e enxergar, ela não participa de exercícios que exijam muito do corpo. Mora sozinha na Água Branca e tem um ajudante que a leva para as aulas.
"É uma terapia. Amo o Cauê. Qual é o jovem que gosta de meninas de 80 para cima?", brinca Vielda. Na apresentação de final de curso no ano passado, ela assumiu a assistência de direção. O professor é só elogios para a sua "menina": "Ela já veio para a aula gripada e doente".
As tarefas não acabam durante o encontro semanal na Estação Ciência. Todos têm de fazer a lição de casa -no momento, uma pesquisa sobre o teatro elizabetano. "Eu cobro. Não penso: ‘Ai, coitadinho do velho’", diz o professor.
Frequentar as aulas, para uma grande parte dos alunos, significa retomar sonhos. "Sempre quis ser artista, ia ao circo, representava no colégio", recorda-se Maria Lúcia Beijós, 64, dois casamentos e o desejo de se tornar uma artista interrompido na primeira união. "Venho para cá feliz, para ver meus amigos e colocar para fora tudo o que eu sinto."
Malu soube da existência do grupo teatral pelo rádio em 2007, quando ficou viúva pela segunda vez. No mesmo ano, estreou na pele de uma personagem que em nada lembra sua vida como dona de casa. Encarnou no palco a prostituta Geni, de "Toda Nudez Será Castigada", do polêmico Nelson Rodrigues. "Me senti uma verdadeira atriz, uma perfeita Geni."
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